Tudo é Vaidade – Uma Reflexão Necessária Vivemos num tempo em que a aparência se sobrepõe facilmente à essência. O valor das pessoas, muitas vezes, é medido pelo número de seguidores que têm nas redes sociais, pela roupa que vestem ou pelo carro que conduzem. O mundo moderno tornou-se, em larga escala, um grande palco de vaidades. Talvez seja tempo de recuperarmos uma velha verdade: tudo é vaidade. Esta frase, com raízes bíblicas e um eco filosófico profundo, não perdeu força ao longo dos séculos. Pelo contrário, parece cada vez mais atual. A vaidade não é apenas o gosto pelo espelho ou pela exibição—é o apego ao transitório, ao que brilha mas não permanece. É a ilusão de que somos importantes porque possuímos, parecemos ou estamos em evidência. Olhemos à nossa volta: aquilo que hoje é moda, amanhã será ridículo. As cidades que hoje são símbolos de modernidade, amanhã poderão ser ruínas. Os líderes idolatrados de hoje, amanhã serão esquecidos ou criticados. O que floresce com esplendor será, inevitavelmente, pisado pelo tempo. O que pulsa com força, um dia será pó. Tudo passa. Este reconhecimento pode ser desconfortável. Ninguém gosta de ser confrontado com a efemeridade das coisas. Preferimos acreditar que deixaremos uma marca eterna, que a nossa obra durará, que a nossa beleza resistirá. Mas a história desmente-nos. Onde estão os impérios que pareciam indestrutíveis? Onde estão os nomes que já ninguém pronuncia? O que hoje é um grande feito, amanhã poderá ser irrelevante. Mas isso não significa que devamos viver sem ambição, sem projetos ou sem sonhos. É essencial distinguir entre construir com sentido e construir por vaidade. Entre viver com profundidade e viver para impressionar. A vaidade seca a alma, porque nos obriga a viver para os outros, para a imagem, para o reflexo que queremos projetar. A essência, por outro lado, convida-nos ao silêncio, à coerência, à verdade. Há algo profundamente libertador em aceitar que tudo é passageiro. Isso liberta-nos da necessidade de impressionar, de vencer sempre, de acumular por acumular. Faz-nos perceber que não somos donos de nada—nem do tempo, nem dos afetos, nem sequer do nosso corpo. Tudo nos é emprestado, e um dia, tudo nos será tirado. Então, o que fazer com o tempo que temos? Se tudo passa, por que não aproveitar com mais autenticidade? Em vez de correr atrás do brilho, por que não sentarmo-nos à sombra e ouvir o que não se diz? Em vez de querer ser lembrado por todos, por que não ser presente para alguns? Talvez estejamos demasiado habituados à ilusão da permanência. A publicidade promete juventude eterna, as redes sociais vendem vidas perfeitas, os gurus garantem sucesso absoluto. Mas tudo isso são castelos de areia. Basta uma maré diferente—uma doença, uma perda, uma crise—e tudo muda. A vaidade não nos salva. A verdade, talvez sim. O que é, afinal, duradouro? O que resiste ao tempo? Os gestos simples. O amor partilhado. A honestidade com que se vive. O respeito pelos outros. A generosidade que não se anuncia. A amizade verdadeira. Esses são os alicerces que, mesmo quando tudo desmorona, permanecem firmes. Dizer que tudo é vaidade não é um convite ao niilismo, mas à lucidez. É um apelo para olharmos para o essencial, para aquilo que nos humaniza e nos aproxima. É um chamado à humildade, num tempo em que todos querem ser extraordinários, únicos, geniais. Talvez não precisemos de tanto. Talvez baste sermos inteiros, autênticos, humanos. Se aceitarmos que o tempo tudo leva, talvez comecemos a dar valor ao que ele ainda nos deixa. E então, perceberemos que viver bem não é deixar um nome gravado na história, mas uma marca gravada no coração de quem tocámos. Tudo é vaidade? Sim. Mas nem tudo tem de ser vão. A escolha é nossa.
by pedro de melo, editor, 2022