O CAFÉ... UMA VIAGEM COM TRAJETOS INESPERADOS O Café na História: Uma Viagem pela Bebida que Marcou Civilizações O café, hoje presença habitual em casas, cafés e escritórios, tem uma história rica e fascinante que atravessa séculos e continentes. A sua origem remonta, segundo a lenda, às terras altas da Etiópia, onde um pastor chamado Kaldi terá notado o efeito estimulante das bagas vermelhas consumidas pelas suas cabras. Este relato, embora mítico, simboliza o início de uma jornada que levou o café das florestas africanas para os mercados do mundo. A difusão do café começou no mundo árabe, particularmente no Iémen, onde, no século XV, os primeiros registos documentados indicam o consumo da bebida. Rapidamente, o café ganhou popularidade como estimulante, sendo consumido nos primeiros estabelecimentos semelhantes a cafés – as chamadas qahveh khaneh – centros de debate, cultura e sociabilidade. Estas casas espalharam-se por cidades como Meca, Medina, Cairo e Istambul, tornando-se locais de convívio e troca de ideias. A chegada do café à Europa ocorreu por volta do século XVII, inicialmente através dos portos de Veneza, e rapidamente conquistou o paladar europeu. Em Inglaterra, França e Países Baixos, começaram a surgir cafés públicos que se tornaram epicentros de discussões intelectuais, muitas vezes apelidados de "universidades da moeda de um cêntimo". O café passou a ser associado ao pensamento crítico e à actividade intelectual. Portugal não ficou alheio a esta tendência. A bebida ganhou terreno lentamente, influenciada pelo contacto com outras culturas e pelos fluxos comerciais. Com as colónias em África e no Brasil, Portugal tornou-se também produtor e distribuidor de café, desempenhando um papel importante na sua circulação global. Cafés históricos como o Brasileira, em Lisboa, não são apenas pontos de consumo, mas verdadeiros marcos culturais e literários. Hoje, o café não é apenas uma bebida: é um fenómeno cultural, social e económico. A sua evolução ao longo do tempo reflecte mudanças nas sociedades, nos hábitos de consumo e na forma como nos relacionamos. Com um simples gesto – o de saborear uma chávena de café – perpetuamos uma tradição com raízes profundas na história da humanidade. O MERCADO A Etiópia é reconhecida como o país ideal para a produção de café, oferecendo todas as condições necessárias. Parece também ter sido de lá que partiu a conquista da Europa há mais de mil anos. Os países na região equatorial proporcionam as melhores condições para o desenvolvimento da planta do café: um clima ameno dia e noite, sem grandes variações de temperatura, com sombra e precipitação favoráveis à planta, que pode atingir até 3,5 metros de altura. Arábica ou Robusta? Não lhes diz muito, pois não? Na maioria dos casos, é a combinação desses dois tipos de planta que resulta na mistura ideal para um café saboroso e equilibrado. As características do solo, do clima e da umidade influenciam, como em tudo o que a natureza nos oferece, os aromas finais do café, tornando-o ainda mais complexo do que outra bebida já naturalmente sofisticada: o vinho. A planta do grão arábica prefere altitudes a partir de 900 metros, onde se desenvolve lentamente, permitindo ao grão reforçar seu futuro aroma. Já a planta robusta faz jus ao nome: é menos sensível às variações de temperatura e mais resistente a parasitas. Por essa razão, é cultivada em maior escala, sendo o Brasil e o Vietnã os principais produtores dessa variedade. O grão robusta contém o dobro da cafeína em relação ao arábica e, por isso, é muito utilizado no café português. Sua intensidade de aromas e a qualidade da espuma conquistam os consumidores lusos. O arábica, por outro lado, caracteriza-se por ser mais frutado e apresentar uma leve acidez, conferindo ao café um sabor mais complexo. E então chegamos às especialidades ainda mais sofisticadas, como o famoso café “Kopi Luwak”, cujo preço pode chegar a 1000 euros por quilo! Esse café é obtido a partir de grãos retirados das fezes de um gato originário da Indonésia. Esse felino tem a curiosa característica de ingerir os grãos de café, e ao passarem pelo seu intestino, sofrem um processo de fermentação que resulta em um aroma mais refinado e macio. Pode ser apenas uma jogada de marketing, mas a jornada dos grãos pelas entranhas do animal o transformou em uma iguaria inacessível para muitos. Outro café exclusivo é o “Black Ivory”, considerado o segundo mais caro do mundo. Nesse caso, são os elefantes da Tailândia que ingerem os grãos cultivados a 1500 metros de altitude. As enzimas intestinais dos elefantes conferem ao produto final notas sutis de chocolate. Na relação de cafés de preços elevados – inflacionados ou não, pois tudo é uma questão de prioridade – encontramos também o “Jamaica Blue Mountain”, cultivado lentamente sob nevoeiro nas montanhas de mesmo nome, a mais de 1800 metros de altitude. Outro exemplo é o café originário da Ilha de Santa Helena, cujo preço pode alcançar 150 euros por quilo e, segundo consta, era o preferido de Napoleão Bonaparte. Uma especialidade curiosa é o “Malabar Monsooned Aspinwall”, cujos grãos, após a colheita, são expostos durante cinco dias às chuvas de monção e depois por mais sete semanas ao vento para secar. Por fim, deixamos as viagens exóticas de lado e apreciamos o nosso café habitual, a nossa querida bica, com dois dedos de conversa e um preço acessível…