UM TRUQUE MOLECULAR QUE MUDOU TUDO — OU QUASE TUDO Como uma bactéria do solo abriu as portas da biotecnologia moderna.
A IDEIA BRILHANTE: USAR A MÁQUINA DA NATUREZA A genialidade dos engenheiros genéticos residia em algo simples: usar a própria bactéria Agrobacterium tumefaciens como veículo de transformação genética. O plano era elegante e ousado. O gene responsável pelos tumores vegetais — contido num anel de ADN circular, o plasmídeo Ti (tumor-inducing) — era substituído por um gene de interesse agrícola. A bactéria, domesticada, tornava-se mensageira genética, transportando instruções novas para dentro do núcleo celular das plantas. Quando o gene se integrava corretamente e a célula começava a produzir a proteína desejada, o resultado era uma nova característica hereditária — inserida não por cruzamento ou acaso, mas por design. O tempo das gerações e dos cruzamentos lentos dava lugar a uma biologia de precisão, célula a célula, com resultados em semanas.
O PLASMÍDEO TI: DE DESCOBERTA A PROTOCOLO O que começou como uma curiosidade microbiana transformou-se rapidamente num protocolo universal. O plasmídeo Ti tornou-se ferramenta de rotina em laboratórios de genética vegetal por todo o mundo. Já não era preciso isolar células únicas ou reconstruir plantas a partir de fragmentos microscópicos: bastava um pedaço de folha. O processo era quase artesanal — e ao mesmo tempo revolucionário:
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Danificava-se ligeiramente o tecido vegetal.
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Inoculava-se com Agrobacterium tumefaciens modificado.
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Após dias de incubação, o gene desejado era transferido para o genoma da planta.
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Células transformadas eram selecionadas com marcadores genéticos (como resistência a antibióticos).
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Hormonas vegetais faziam o resto: regeneravam-se plantas inteiras.
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O resultado era vida reprogramada — uma planta capaz de transmitir a sua nova característica às gerações seguintes.
MONSANTO E A CORRIDA PELO DOMÍNIO GENÉTICO Com este método, a Monsanto entrou em cena como protagonista. A empresa criou mais de 45.000 linhagens transgénicas, testando genes para resistência a herbicidas, tolerância a insetos, eficiência nutricional e durabilidade pós-colheita. Cada linhagem era uma tentativa, uma aposta. E a soma dessas tentativas tornou-se um império biotecnológico. O mundo observava fascinado — mas também inquieto. O domínio da técnica tornava-se poder económico e político, e o debate deixava de ser apenas científico.
O LIMITE INVISÍVEL: QUANDO OS CEREAIS DIZEM NÃO O método Ti era poderoso, mas não universal. Funcionava bem em dicotiledóneas — plantas de duas folhas embrionárias como tabaco, tomate, batata e soja. Mas os cereais, as culturas mais críticas da civilização, pertencem às monocotiledóneas — e resistiam à infeção bacteriana. O sonho de modificar trigo, milho e arroz continuava fora de alcance. A ironia era evidente: as plantas que alimentavam o planeta eram as mais intransigentes à manipulação genética, enquanto as espécies de laboratório floresciam coloridas e obedientes sob luz artificial. Com o tempo, o truque Ti chegou também às Brassicaceae, como a colza (canola) — essencial para óleos e biocombustíveis. Mas o “Santo Graal” dos cereais exigiria outras técnicas — choques elétricos, canhões de partículas, e mais tarde, edição genómica de precisão.
ENTRE TRIUNFO TÉCNICO E CRISE ÉTICA No auge do entusiasmo, a engenharia genética parecia ter conquistado o código da vida. Mas cada sucesso técnico trouxe novas perguntas:
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Quem controla as sementes e as licenças?
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O que acontece à biodiversidade quando o campo se uniformiza?
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Quem define o limite entre inovação e interferência?
A biotecnologia deixava de ser um campo neutro. Tornava-se terreno de disputa ética, económica e política. O poder de “reescrever a natureza” expunha o dilema central: poder não é o mesmo que dever.
HOJE: NOVAS FERRAMENTAS, VELHAS PERGUNTAS Hoje, tecnologias como o CRISPR-Cas9 tornaram a edição genética mais precisa, acessível e reversível. Mas as questões que nasceram nos anos 90 continuam intactas:
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O agricultor é dono da semente que planta?
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A diversidade genética pode sobreviver à lógica das patentes?
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A promessa de alimentar o mundo justifica o risco de o uniformizar?
Vivemos numa era em que o genoma se escreve em ecrãs, e a biologia se gere por software. Entre a inovação e a dependência, a linha é tão fina quanto um filamento de ADN.
*A pergunta deixou de ser “podemos?”. A pergunta, agora, é “devemos — e a quem serve o que fazemos?”. by myfoodstreet 2025

GLOSSARIO
INDEX CULINARIUM XXI, Divulgação GlobalPROCURA NO PORTAL DAS COMUNIDADES
ROTEIRO DO REGRESSO A PORTUGAL
PORTUGAL ESSENTIALS
100 DICAS PARA TER À MÃO, 100 DIAS SEM TENSÃO
BLOCO DE NOTAS, CRONICAS E CONTEÚDOS, PARTICIPA!
ESCRITOR ADEMIR RIBEIRO SILVA


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