
O Dia em que os Genes Cruzaram a Fronteira do Milho: Uma Reflexão Sobre o Início da Era Transgénica Uma manhã de Outono, um grito de euforia científica No início do Outono de 1990, o mundo da ciência vibrou com entusiasmo. Os meios de comunicação anunciavam, com estrondo, um “avanço na engenharia genética”, proclamado como a invenção de uma década, com promissoras repercussões económicas a nível global. E, de facto, não era para menos. Pela primeira vez, cientistas tinham conseguido o que até então era apenas ambição da BioTechnica e de outros gigantes biotecnológicos: criar variedades de cereais transgénicos com genes estrangeiros integrados diretamente no seu material genético. A barreira invisível dos cereais Até essa altura, as culturas mais essenciais para a sobrevivência humana permaneciam praticamente impenetráveis à manipulação genética. O trigo, base alimentar de milhares de milhões, com mais de 770 milhões de toneladas produzidas anualmente em cerca de 220 milhões de hectares – uma área mais de seis vezes o tamanho da Alemanha reunificada – resistia à engenharia genética. O mesmo acontecia com o arroz (hoje com produção superior a 780 milhões de toneladas), o milho (mais de 1,2 mil milhões de toneladas) e o sorgo, amplamente cultivado nas regiões tropicais. Estes grãos eram, por décadas, o “Santo Graal” dos engenheiros genéticos, inatingíveis apesar de ferramentas sofisticadas e sucessos noutras espécies vegetais. A frustração da ciência: uma década sem frutos Durante anos de frustração e tentativa e erro, os cientistas conseguiam inserir genes estranhos nas células dos cereais, e até ancorá-los no genoma com sucesso. Em teoria, estava tudo certo. Mas na prática, a regeneração da planta a partir dessas células era, muitas vezes, um beco sem saída. Mesmo nos raros casos em que a transferência genética funcionava, o passo seguinte falhava: nenhuma planta viável emergia, e nenhuma semente era produzida. Era como esculpir uma obra-prima, apenas para vê-la desintegrar-se antes de estar concluída. O truque da natureza: uma bactéria com um segredo Curiosamente, outras plantas não se mostravam tão resistentes à manipulação genética. Desde 1983, cientistas como Jozef Schell, do prestigiado Instituto Max Planck de Investigação do Melhoramento de Plantas, em Colónia, haviam descoberto uma estratégia brilhante – quase poética – para introduzir genes nas plantas: usar a própria natureza como aliada. A chave? Uma bactéria do solo chamada Agrobacterium tumefaciens. Esta bactéria, na sua ação natural, infeta plantas e provoca a formação de galhas (crescimentos anómalos semelhantes a tumores). Através de uma molécula circular de ADN, o Agrobacterium penetra na célula da planta e altera o seu comportamento, forçando-a a seguir instruções genéticas estranhas, como se a planta fosse um computador a executar um código imposto. Quando o invasor se torna ferramenta A genialidade dos cientistas foi converter essa capacidade natural de invasão genética num instrumento de engenharia. A bactéria, em vez de provocar doença, passou a ser programada para transportar genes desejados, abrindo portas a um novo mundo de possibilidades. Hoje, este processo é uma das ferramentas mais comuns na biotecnologia agrícola – mas a sua origem, essa sim, é marcada por resiliência, criatividade e a capacidade humana de observar a natureza e aprender com ela.
???? Reflexão: entre ética, ciência e o futuro do alimento Trinta e cinco anos depois, estamos no meio de um debate ainda mais profundo: afinal, até que ponto devemos modificar geneticamente aquilo que nos alimenta? Os OGMs (organismos geneticamente modificados) tornaram-se comuns em várias partes do mundo – do milho às batatas, da soja à maçã – e continuam a levantar questões sobre saúde, ambiente, poder económico e soberania alimentar. Aquela manhã de Outono de 1990 não foi apenas um marco tecnológico. Foi o início de uma era em que o ser humano aprendeu a escrever diretamente no livro da vida – e, com isso, ganhou uma responsabilidade que vai muito além da ciência. O que faremos com este poder nos próximos 35 anos? Estamos preparados para escolher com sabedoria, com ética, e com coração?
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