
Lídia, a Mercadora de Púrpura Quando a fé atravessa o mar e entra em casa Há encontros discretos que mudam continentes. A história de Lídia, a mercadora de púrpura, é um desses momentos silenciosos em que o Evangelho entra na Europa não pela força, mas pela hospitalidade, pela escuta e pela abertura do coração.
Paulo, o caminho e o mar O trabalho missionário de Paulo iniciou-se em Antioquia, então a terceira maior cidade do mundo mediterrânico, depois de Roma e Alexandria. Foi ali que, pela primeira vez, os seguidores de Jesus passaram a ser chamados cristãos (Atos 11:26). A partir desse centro vibrante, Paulo lançou-se a um percurso extraordinário: quatro grandes viagens missionárias, somando mais de 19.000 quilómetros, atravessando terras e mares, pregando, ensinando, escrevendo e cuidando dos doentes. A rota passou pela Ásia Menor, cruzou o Mar Egeu, chegou à Grécia e estendeu-se pelo Mediterrâneo até Creta, Malta e Roma. Um mundo ligado por estradas romanas e rotas marítimas — uma realidade que, de certa forma, antecipa a Europa aberta e viajante que hoje se reconhece, e que Portugal, na sua vocação atlântica, bem conhece.
A chegada à Europa Na segunda viagem missionária, Paulo viajou acompanhado por Silas, Lucas e Timóteo. A entrada na Europa deu-se por Trôade, perto da lendária Tróia de Homero. Dali, navegaram até Neápolis (a atual Kavala, na Macedónia) e seguiram para o interior até Filipos, uma colónia romana próspera e estratégica. Foi fora das muralhas da cidade, junto a um rio — lugar de oração e recolhimento — que aconteceu um dos encontros mais decisivos da história cristã europeia. “Estava a ouvir uma mulher piedosa chamada Lídia, vendedora de púrpura da cidade de Tiatira. O Senhor abriu-lhe o coração.” (Atos 16:14)
Lídia: mulher, comerciante, líder Lídia não surge como figura marginal. Era uma mulher rica, comerciante de púrpura, um dos bens mais valiosos da Antiguidade. A púrpura, extraída de moluscos marinhos, era cara, trabalhosa de produzir e associada ao poder, à elite e ao prestígio. Vestiam-na imperadores, magistrados e sacerdotes. Natural de Tiatira, na Ásia Menor, Lídia estabelecera-se em Filipos por razões comerciais. O texto bíblico sugere uma mulher independente, instruída e influente, com casa própria e capacidade para acolher outros. Após ouvir Paulo, foi baptizada com toda a sua família — provavelmente as primeiras conversões cristãs em solo europeu — e fez um gesto decisivo: abriu a sua casa.
A fé que se senta à mesa A conversão de Lídia não ficou no íntimo. Tornou-se hospitalidade concreta. A casa transformou-se em lugar de encontro, oração e refeição partilhada — uma igreja doméstica. É significativo que a expansão do cristianismo na Europa comece à volta de uma mesa, num espaço privado, sustentado por uma mulher. Também na realidade portuguesa, onde a fé popular muitas vezes se vive em casa — à mesa, na cozinha, nas conversas longas — este gesto encontra ressonância profunda.
Filipos: mercado, rotas e abundância Como colónia romana, Filipos era um ponto de circulação intensa. Nos seus mercados encontravam-se produtos de todo o Império. Numa casa abastada como a de Lídia, a lista de compras incluiria especiarias da Índia, tapetes da Ásia Menor, vidro, linho e alabastro do Egito, bem como queijo, mel e ostras. Os cozinheiros poderiam adquirir caranguejos frescos a pescadores locais, raízes tenras de cherovia, legumes sazonais e ervas aromáticas para saladas campestres. O peixe era abundante: Neápolis oferecia acesso tanto ao Mar Egeu como, pelas rotas comerciais, ao Mediterrâneo mais amplo. Esta abundância recorda a diversidade alimentar que hoje se vive em Portugal, fruto de mercados, portos e trocas — do peixe fresco à especiaria longínqua, da horta ao mar.
Púrpura e simplicidade É um paradoxo belo: a fé europeia nasce numa casa rica, mas anuncia uma mensagem de simplicidade, igualdade e comunhão. A púrpura, símbolo de estatuto, não impede a abertura ao outro; antes, torna-se meio de serviço. Lídia mostra que a prosperidade não é obstáculo à fé, quando se transforma em partilha. A riqueza, quando acolhe, perde o peso da ostentação e ganha o valor do encontro.
Uma herança que permanece A história de Lídia recorda que a Igreja cresce quando alguém abre a porta — da casa e do coração. Não por imposição, mas por escuta; não por poder, mas por hospitalidade. Num tempo em que a Europa procura novamente sentido e pertença, esta mulher de Filipos deixa uma pergunta atual: o que fazemos com o que temos? Guardamos, exibimos ou partilhamos? Porque, tal como então, há conversões que começam com uma escuta atenta e se confirmam à mesa. myfoodstreet.pt 2025



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