
O Mundo Antigo e o Fascínio das Especiarias Quando o sabor viajava pelos mares e desertos Muito antes de o sal ser uma moeda e de a pimenta justificar guerras e fortunas, já o mundo antigo se movia ao ritmo das especiarias. Entre o perfume da canela e o brilho do cravinho, nasceu uma das primeiras redes de comércio global — feita de rotas marítimas, desertos e sonhos de imortalidade. As civilizações antigas sabiam que o sabor tinha poder. Não apenas o poder de transformar a comida, mas o de abrir fronteiras, unir impérios e inspirar mitos.
As origens: das margens do Eufrates às rotas do Indo Muito antes de Roma ou Atenas, as especiarias já perfumavam as cidades da Mesopotâmia. Escavações na antiga Erech (Uruk), uma das mais antigas cidades sumérias, revelaram inscrições e objetos que mencionam produtos aromáticos usados há mais de 5.000 anos. Esses textos, decifrados em escrita cuneiforme, falam de óleos, resinas e condimentos preciosos — sinais de um comércio que ligava povos separados por milhares de quilómetros. Nas margens do Eufrates, as especiarias eram mais do que luxo: eram símbolos de status e oferendas divinas. Muitas lendas assírio-babilónicas narram histórias de reis e rainhas que procuravam nelas a chave da longevidade — uma busca pela imortalidade através do aroma. Mais a leste, florescia a Civilização do Indo, com a cidade de Mohenjo-Daro como um dos seus maiores centros urbanos. Entre os vestígios arqueológicos — templos, armazéns e casas com canalizações — surgem provas de que os habitantes já comercializavam especiarias vindas do Ceilão (atual Sri Lanka) e da Costa do Malabar, no sudoeste da Índia. Essas trocas mostram que, já no 3.º milénio a.C., o comércio internacional de especiarias estava estabelecido.
A sabedoria da China antiga No extremo Oriente, a China desenvolvia uma relação igualmente antiga com os aromas e sabores. Um tratado botânico menciona a canela (então chamada kwei) já em 1200 a.C., e um herbário da época descreve a árvore da cássia, a variedade chinesa da canela. Os cronistas relatam um costume curioso na corte imperial: os dignitários mastigavam cravinhos antes de se apresentarem ao Imperador, para garantir um hálito agradável. A etiqueta e o respeito estavam impregnados de perfume — literalmente. Essa tradição, aparentemente banal, revela como as especiarias tinham já um papel simbólico profundo: eram sinais de pureza, respeito e sofisticação.
Os Fenícios: senhores do comércio e do mar Enquanto isso, no Mediterrâneo, os Fenícios transformavam o comércio em arte. Vindos das terras que hoje correspondem ao Líbano, Síria e Palestina, estes navegadores intrépidos fundaram postos e colónias em Chipre, Creta, Sicília, Malta e ao longo da costa norte de África. A sua capital, Tiro, mantinha contacto constante com o Egito e a Mesopotâmia. Dali partiam navios carregados de madeira de cedro, metais, tecidos e especiarias, rumo aos grandes portos do mundo antigo. Os Fenícios foram também os primeiros europeus a atravessar o Estreito de Gibraltar, fundando Cádis, perto da foz do Guadalquivir, e estabelecendo laços comerciais com o noroeste da Península Ibérica — onde obtinham estanho e prata. Na costa norte de África, fundaram Cartago, a “Nova Cidade” (Kart Hadasht), que viria a tornar-se um dos centros culturais e comerciais mais poderosos do Mediterrâneo. Daí exportavam um dos produtos mais valiosos do seu tempo: o pigmento púrpura, extraído de caracóis marinhos — um luxo reservado a reis e sacerdotes. O comércio, não a agricultura, foi a verdadeira força dos Fenícios. E com ele, espalharam sabores, aromas e cores por todo o mundo conhecido.
O Egito e o poder do perfume No Egito Antigo, as especiarias tinham um valor sagrado. Eram usadas não só na alimentação, mas também na medicina, nos rituais religiosos e na mumificação. O incenso e a mirra acompanhavam o defunto na sua viagem para o além, e o aroma tornava-se ponte entre o humano e o divino. As especiarias egípcias não eram apenas importadas — eram também cultivadas e transformadas com mestria. O Egito era o coração aromático do mundo antigo, um centro onde se cruzavam caravanas do deserto, navios do Mar Vermelho e embarcações fenícias vindas do Mediterrâneo.
O legado das especiarias A história das especiarias é, em última análise, a história da curiosidade humana. Desde os sumérios e egípcios até aos gregos e fenícios, os povos do mundo antigo perceberam que o sabor podia ligar culturas, mover exércitos e inspirar impérios. Essas pequenas sementes, cascas e resinas moldaram rotas, religiões e até línguas. Em cada grão de pimenta, em cada fio de açafrão, há um eco dessas primeiras trocas que, muito antes da globalização moderna, já faziam do mundo um mercado de aromas e sonhos. E talvez seja por isso que, mesmo hoje, ao sentir o cheiro da canela ou do cravinho, algo dentro de nós recorda o passado — um passado em que o sabor era poder, e o perfume, uma forma de eternidade.

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