
Herodes, o Grande: Luxo, Medo e o Banquete do Poder A história raramente é generosa com os tiranos, mas também não lhes nega complexidade. Herodes, o Grande é uma dessas figuras difíceis de ignorar: astuto, cruel, politicamente brilhante e profundamente inseguro. Como muitos governantes antes e depois dele, compreendeu cedo que o poder se conquista tanto no campo de batalha como na arte de escolher o lado vencedor.
Da guerra civil ao favor de Roma Durante as guerras civis romanas, Herodes revelou-se um hábil sobrevivente político. Mudou de alianças no momento certo e acabou por apoiar Octávio, o futuro Imperador Augusto. Esse apoio não foi esquecido. Em troca, Roma sustentou a sua reivindicação ao trono da Judeia, permitindo-lhe governar por mais de trinta anos. Para consolidar esse poder, Herodes não hesitou em eliminar todos os seus adversários — reais ou imaginários. O seu reinado foi marcado pelo medo, mas também por uma ambição construtiva sem precedentes.
Construir para dominar Como tantos tiranos da Antiguidade, Herodes era um construtor obsessivo. A grandiosidade das suas obras não era mero gosto estético; era estratégia política. Nada simboliza melhor esta mentalidade do que a fortaleza de Massada, erguida junto ao Mar Morto, a 518 metros acima do nível do mar. O historiador Flávio Josefo descreveu-a como: “Protegida pelos céus e pelos homens, fortificada contra qualquer inimigo que ousasse lutar contra ela.” As muralhas elevadas, as torres imponentes e a localização quase inacessível transformavam Massada num refúgio inexpugnável — um monumento ao medo e à desconfiança.
O luxo no topo do deserto Segundo Josefo, o complexo incluía palácios, passagens, termas e reservatórios de água, todos sustentados por colunas talhadas numa só pedra. Os pavimentos e paredes eram revestidos com pedras de várias cores, e grandes grutas escavadas na rocha funcionavam como cisternas, garantindo água em abundância. Uma estrada secreta conduzia diretamente ao topo da montanha, invisível do exterior. Tudo era pensado para conforto absoluto e segurança total. O Palácio do Norte, a residência privada de Herodes, era particularmente luxuoso. O balneário incluía frigidarium, tepidarium e caldarium, com aquecimento de chão e mosaicos a preto e branco. No vestiário, frescos decoravam as paredes, incluindo a imagem de uma tamareira, símbolo da fertilidade daquela região árida.
Um banquete sobre o abismo É fácil imaginar, neste cenário quase irreal, os preparativos para um banquete íntimo da corte. Uma longa mesa baixa, posta para cerca de quinze convidados, vergava sob o peso das iguarias. Os convidados eram conduzidos para a sala de jantar enquanto músicos tocavam suavemente liras e pandeiretas. A refeição poderia começar com uma sopa de Tique, preparada com pinhões, nozes e espinafres. Tique, deusa romana da fortuna, era venerada por Herodes, que lhe mandara erguer uma grande estátua em Cesareia, a cidade de mármore branco erguida à beira do Mediterrâneo em honra do poder romano. Seguiam-se carnes nobres: gazela, aves de caça e outros pratos dignos de uma mesa real.
Fazer florescer o deserto Servir tamanha abundância num local tão remoto parecia impossível. Como poderiam os legumes e frutas prosperar junto ao Mar Morto? A resposta surgiu nas escavações conduzidas por Yigael Yadin, que confirmaram os relatos de Flávio Josefo sobre chuvas torrenciais sazonais. Durante os meses de inverno, o deserto cobria-se de flores e vegetação. Herodes prolongou esse milagre natural através de um engenhoso sistema de irrigação, utilizando água armazenada em enormes cisternas. Assim, era possível cultivar legumes, leguminosas, alface, alcachofras, chicória e melões, bem como oliveiras e tamareiras. O que não era consumido fresco era seco, conservado ou armazenado em vastos celeiros próximos do palácio.
Os vestígios da abundância No terraço inferior de Massada foram encontrados restos de grãos, romãs, nozes, azeitonas, tâmaras e sal. Descobriram-se também grandes ânforas de vinho, uma das quais ostentava a inscrição: “Para o rei Herodes da Judeia.” A predileção de Herodes pelo vinho italiano revela não só o seu gosto pessoal, mas também o desejo de afirmar pertença ao mundo romano e à sua elite cultural.
Entre o esplendor e o vazio A mesa de Herodes era farta, luxuosa e cuidadosamente planeada. Mas por detrás do brilho havia medo, solidão e desconfiança. Diferente de David ou Salomão, cuja abundância estava ligada à aliança e à promessa, a de Herodes servia sobretudo para afirmar poder e afastar ameaças. Também hoje, numa realidade portuguesa onde a comida continua a ser sinal de partilha e comunidade, a figura de Herodes recorda uma verdade incómoda: a abundância sem justiça não gera paz. A sua mesa impressionava, mas não reconciliava. E talvez por isso, apesar de todo o luxo, o seu reinado nunca conheceu verdadeira tranquilidade. myfoodstreet.pt 2025



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