
João Batista: O Deserto, o Essencial e o Sabor da Verdade A história de João Batista começa de forma simples, como a de qualquer rapaz judeu do seu tempo, mas termina por se tornar profundamente radical. A sua vida é um convite constante à sobriedade, à escuta e à coerência, e a sua relação com a comida reflete com clareza essa escolha interior.
A infância moldada pela tradição Quando um rapaz judeu completava seis anos, passava a frequentar diariamente a sinagoga, onde aprendia a Lei, os mandamentos de Moisés, as tradições hebraicas e as histórias dos patriarcas. À tarde, se o pai tivesse um ofício — como carpinteiro, oleiro ou agricultor — o filho acompanhava-o como aprendiz. Dentro de casa, o trabalho da mãe era incessante. Acordava ainda antes do amanhecer para moer o grão, preparar o pão fresco, ir à fonte buscar água, fiar o linho e a lã e confeccionar as túnicas da família. Era uma vida dura, mas profundamente ritmada, onde cada gesto tinha sentido.
A espera da grande festa No meio da rotina exigente, havia um momento aguardado com ansiedade por toda a família: a Páscoa, também chamada Festa dos Ázimos, celebrada em Jerusalém na primavera. A cidade enchia-se de peregrinos vindos de todas as regiões para celebrar a libertação do povo de Israel do cativeiro egípcio. Essas peregrinações, a força da memória coletiva e o significado espiritual da liberdade moldaram profundamente a infância de João.
João e Jesus: caminhos que se cruzam João Batista foi contemporâneo de Jesus. As suas mães eram parentes próximas, embora não haja certeza de que se tenham conhecido na infância. O que a tradição preserva com clareza é o encontro decisivo no rio Jordão, quando João batizou Jesus, marcando o início da sua missão pública. O Evangelho de Lucas situa este momento com rigor histórico: “No décimo quinto ano do reinado do imperador Tibério…” (Lucas 3:1–3) Estamos no inverno do ano 28 d.C., quando João começou a pregar na região do Jordão, chamando à conversão, à justiça e à preparação interior.
A escolha do deserto João não foi apenas um pregador; foi um sinal vivo. Renunciou deliberadamente aos confortos da vida comum para se dedicar inteiramente à sua missão. O Evangelho de Marcos descreve-o de forma clara: “João vestia-se de pelos de camelo e tinha um cinto de couro à cintura; alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre.” (Marcos 1:6) A sua alimentação era austera, mas não desprovida de sentido.
O que eram os “gafanhotos”? A palavra “gafanhotos” tem gerado debate entre estudiosos. Alguns defendem que se trata do inseto propriamente dito, comum na região e permitido pela Lei judaica. Outros sugerem que poderá referir-se ao fruto da alfarrobeira, também conhecido como “pão de São João”. As vagens de alfarroba, nutritivas e ricas em açúcares naturais, eram frequentemente utilizadas como alimento para animais e para os mais pobres. É este mesmo alimento que aparece na parábola do filho pródigo, que desejava comer as vagens dadas aos porcos antes de reconhecer o seu erro. Seja qual for a interpretação, a mensagem é clara: João alimentava-se do mínimo necessário, do que a terra oferecia sem mediações.
Pão, profetas e simplicidade A vida simples de João aproxima-o dos grandes profetas do Antigo Testamento. A receita do pão de Ezequiel (Ezequiel 4:9), feita com trigo, cevada, feijão, lentilhas, milho-miúdo e espelta, estava ao alcance de qualquer pessoa do seu tempo. Os ingredientes eram comuns e acessíveis, e a receita era conhecida. É fácil imaginar que João, profundamente enraizado na tradição profética, tivesse presente este pão simbólico — alimento de resistência, fidelidade e espera. Tal como hoje, também então os alimentos básicos estavam disponíveis a quem quisesse viver de forma simples e consciente.
A cozinha da verdade Os restantes pratos associados a este período refletem a cozinha judaica simples da época: leguminosas, pão rústico, mel, ervas silvestres. Nada de excessos, nada de artifícios. Cada alimento era o que parecia ser. Também na tradição portuguesa, onde o pão, o mel e os alimentos da terra continuam a ocupar um lugar central, esta sobriedade encontra eco. João Batista recorda que a verdade não precisa de ornamentos, e que a alimentação pode ser expressão de uma escolha interior.
Uma vida que aponta para o essencial João Batista não viveu para si. A sua missão foi preparar o caminho, apontar para outro, desaparecer para que a verdade emergisse. A sua mesa era pobre, mas o seu testemunho era rico. Num mundo saturado de ruído, consumo e excesso, a sua figura continua a interpelar: o essencial basta, quando o coração está desperto. Porque, no deserto ou na cidade, há um tipo de fome que só se sacia com sentido. myfoodstreet.pt 2025



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